terça-feira, 2 de junho de 2015

Talvez não sobre pedra sob pedra...

Não é de hoje que Botucatu assiste entorpecido ao desmonte da história local, materializada, entre outras ações, na avalanche de demolições de prédios que poderiam se tornar equipamentos de preservação da memória, justamente por terem sido partes da história dos Bons Ares.
O Jornal Diário da Serra de terça-feira (2) enseja essa reflexão logo em sua 1ª página.
A chacina mais recente está ocorrendo no antigo Cine Vitória, depois Cine Vila Rica (O cinema do Bairro), marco da descentralização do acesso à cultura cinematográfica de Botucatu. Ainda no mesmo ramo de atividade, não se pode esquecer o “Cine Cassino” (no centro da Cidade), que chegou a ser uma das principais salas de cinema do País – figurando entre os primeiros locais de reprodução fílmica brasileira.
E existem outros exemplos de tragédias concretizadas, como os imóveis das Indústrias Bacchi (próximas à Estação Ferroviária), a Sede dos Vicentinos, a Oficina de Máquinas do Complexo Ferroviário, quase todas as fachadas dos prédios da Rua Amando de Barros e Rua Floriano Peixoto (que se configuram no primeiro eixo comercial local).
Além disso, também existem aquelas tragédias que estão à espera do momento de ocorrer – como o prédio que abriga a 1ª Companhia de Polícia Militar do Estado São Paulo (no início da Rua Major Matheus), que foi vendido à iniciativa privada em 2012 pela Prefeitura Municipal, a partir da anuência da 15ª Legislatura da Câmara Municipal, por meio do Projeto de Lei nº 98/2012 – aprovado pela maioria absoluta dos senhores vereadores, inclusive por ex-parlamentares que se dizem protetores da história.
Esse imóvel foi o local onde funcionou pela primeira vez a Escola Estadual Dom Lúcio, a primeira escola da Zona Norte botucatuense. Agora, acredita-se, aguarda a saída da corporação policial para concretização de seu triste fim.
Outra tragédia anunciada é o próprio imóvel onde até recentemente funcionava o Jornal Diário da Serra. O periódico segurava a manutenção desse patrimônio, mas com sua saída talvez ninguém saiba o que pode ocorrer.
Mas estas mal traçadas linhas não carregam nenhum tipo de crítica aos empreendedores privados ou à própria Polícia Militar, que à época da privatização do prédio que utiliza como sede solicitava justamente instalações mais apropriadas ao desempenho da função – já que a antiga escola estaria “em petição de miséria”, à “beira da destruição”, com “risco de queda”, como relatado na Sessão Ordinária do dia 12 de Dezembro de 2012, na Câmara Municipal de Botucatu. E que, apesar disso, ainda está em plena atividade.
Não se pode esperar que os empreendedores privados estejam preocupados com a preservação de patrimônios históricos, apesar de alguns sábios demonstrarem apreço à questão.
Trata-se, na verdade, de uma perspectiva de atuação que deve partir do Poder Público, em conjunto com a sociedade civil organizada ou não.
Também, vale lembrar, que este texto não pretende dicotomizar o debate entre “Prefeitura fez” versus “Prefeitura não fez” ou “O grupo no poder é bom” versus “O grupo no poder não é bom”, ou qualquer redução da discussão às insignificâncias das legendas partidárias.
Óbvio que aqui são reconhecidas iniciativas importantíssimas dos últimos Governos, como a compra da sede da antiga Fazenda Monte Alegre e a ocupação do prédio da administração ferroviária (na Administração petista), ou a restauração do prédio do antigo Fórum e a compra das instalações do extinto Hospital Sorocabana (na gestão tucana).
Óbvio também que aqui são reconhecidas as perdas em patrimônios históricos de suas respectivas épocas.
O que este texto trata é sobre uma aparente falta, ou não aplicação, de uma Política Pública definida para a preservação do patrimônio histórico/cultural botucatuense, para além de ações isoladas importantes.

O debate é relevante em função de ser a história de uma comunidade que lhe confere identidade e sentido de unidade.


E sem sombra de dúvidas, sem história uma cidade se transforma em um aglomerado humano “sem cara”, “sem saber de onde veio” e, provavelmente, “sem saber para onde vai”...